Texto Completo

A Câmara Municipal de Ouro Preto decreta:

Art. 1°- Institui-se o programa “Escola Democrática", em todos os níveis de educação pública no Município de Ouro Preto, observando os seguintes princípios:

I- Educação para o Pleno desenvolvimento integral das pessoas e a formação para o exercício de cidadania;

II- A livre manifestação do pensamento, respeitando a pluralidade étnica, religiosa, científica, ideológica, política, de orientação sexual e da identidade e/ou expressão de gênero;

III- Liberdade plena para aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento a arte e o saber sem qualquer tipo de censura ou repressão;

IV- A livre organização de professores e funcionários via Sindicatos e Associações; e de pais e Responsáveis via Associação de pais e similares;

V- A livre organização democrática estudantil em Grêmios, Centros Acadêmicos, Diretórios e similares;

VI- A não violência e a não discriminação, com respeito às diferenças entre os povos, os países, as etnias, as culturas, gêneros e os comportamentos; repudiando o preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade, deficiência e quaisquer outras formas de discriminação;

VII- Garantia à segurança individual e coletiva, do aluno, do professor, e das organizações, com fomento de campanhas anti-bullying.

Art. 2º. São vedadas, em sala de aula ou fora dela, em todos os níveis e modalidades de educação do município de Ouro Preto, as práticas de quaisquer tipos de censura de natureza política, ideológica, filosófica, artística, religiosa e/ou cultural a estudantes e docentes, ficando garantida a livre expressão de pensamentos e ideias, observados os direitos humanos e fundamentais, os princípios democráticos e os direitos e garantias estabelecidos no artigo 1º da presente Lei, na Constituição Federal e nos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.

§1º. Os princípios elencados nesta Lei não excluem outros trazidos nos Tratados Internacionais de Direitos Humanos dos quais o país é signatário, na Constituição Federal e na Lei Orgânica Municipal, serão interpretados de modo a garantir a liberdade, a pluralidade e o respeito aos direitos humanos, não podendo ser invocados para permitir a imposição autoritária aos estudantes das ideias e concepções de docentes e autoridades.

§2º. As liberdades de expressão e manifestação serão garantidas a docentes e estudantes, permitindo-se o conhecimento de diferentes pontos de vista e o debate democrático e respeitoso de ideias e visões de mundo, sem confundir liberdade de expressão e manifestação com proselitismo de preconceito, de discriminação ou de segregacionismo.

Art. 3º. Fica assegurado o direito de estudantes matriculados em todos os níveis de ensino municipal a receberem informação sobre os direitos e deveres individuais e coletivos garantidos pelo Art. 5º da Constituição Federal.

Parágrafo Único. Para fins do disposto no caput deste artigo, as escolas manterão cartazes no alfabeto ordinário e em Braille com o conteúdo previsto no Anexo desta Lei, que deverão ser afixados em locais onde possam ser lidos por todas as pessoas que frequentam o ambiente escolar, especialmente estudantes e docentes.

Art. 4º. Fica assegurado, em todos os concursos públicos para provimento de cargo de professores da rede pública, o direito à não discriminação e censura, sobre quaisquer matérias e assuntos.

Art. 5º. O disposto nesta Lei aplica-se, no que couber:

I – aos livros didáticos e paradidáticos adotados na rede pública municipal

Art. 6º. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

 

 

 

 

 

 

JUSTIFICATIVA

“Que metro serve para medir-nos

Que forma é a nossa e que conteúdo (...)

Carlos Drumond de Andrade

 

Este projeto de lei surge da necessidade da população de Ouro Preto, e seus representantes na Câmara de Vereadores, promoverem um debate e aprovarem um conjunto de medidas que possam barrar, no âmbito da Cidade, e dar uma resposta à pretensão autoritária, dos que querem criminalizar o pensamento livre e promover o medo, o silêncio, a censura, a perseguição aos defensores da liberdade de expressão e pensamento nas escolas brasileiras.

Tal procedimento, servirá de apoio para lutas em outros municípios e estados. O Projeto é muito mais amplo: Pretende, longe de discursos fáceis e sectários, colaborar para a construção de uma educação que, agindo no presente construa indivíduos e coletividades que se respeitem, pensem por si mesmos e concebam suas próprias opiniões e visões de mundo.

É, também, um projeto que objetiva combater todas as formas de discriminação, de preconceito e intolerância no âmbito da educação, e da sociedade, garantindo o respeito às diferenças e prevenindo formas de violência, como o bullying e assédio escolar.

O presente Projeto foi elaborado a partir de discussões de três propostas recentemente apresentadas: 1) do Deputado Estadual Juliano Roso (PCdoB) na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, intitulada “Escola sem Mordaça”, 2) A Lei 6005/16 do Deputado Federal Jean Wyllys (PSOL) na Câmara Federal, denominado “Escola Livre” e 3) o projeto 05/2017 da Vereadora Marta Rodrigues (PT) Salvador. À eles, o reconhecimento do pioneirismo das iniciativas e um agradecimento especial pela inspiração.

Nas palavras do Dep. Federal Jean Wyllys “Uma escola sem laicidade e liberdade de crença e de não-crença produz uma sociedade com graves problemas de intolerância religiosa, fanatismo e fundamentalismo. Uma escola que permite — ou, ainda pior, reproduz e ensina como valor — o preconceito e a discriminação produz uma sociedade com altos índices de ignorância, incompreensão, exclusão, segregação, discriminação e violência. Uma escola onde o racismo, o machismo, a xenofobia, o preconceito contra as pessoas LGBTIQS e outros discursos de ódio são tolerados ou incentivados produz uma sociedade que tende a não combater esses males.

A escola… Precisa garantir a todos e todas — docentes, estudantes e responsáveis, parentais ou não — o direito à liberdade de manifestação e de expressão intelectual e a liberdade para aprender, ensinar, pesquisar, ler, publicar e divulgar a cultura, o conhecimento, o pensamento, as artes e o saber, sem qualquer tipo de censura ou mordaça...

Deve educar de modo a despertar nos e nas estudantes a curiosidade e o engajamento político saudável, sem qualquer tipo de doutrinação ou imposição das ideias de docentes e autoridades, colocando todas as opiniões em debate sem qualquer tipo de censura”.

Os caminhos da educação no Brasil tem sido alvo de grandes discussões no último período. A chamada “onda conservadora” que tenta se impor no país esconde suas vontades autoritárias e obscurantistas, em caricaturas de Projetos educacionais – ou de escola, como preferem alguns – e quer promover retrocessos em avanços realizados ao longo de décadas.

Com um discurso reacionário, antipedagógico, e com linguagem próxima do senso comum, alguns desses movimentos querem partidarizar a escola e impor suas concepções antidemocráticas de ensino público. Querem a todo custo determinar que visões anticientíficas, particularistas, religiosas e segregacionistas sejam base da educação nacional. Dessa maneira semeiam a ignorância, a intolerância e a discórdia entre os brasileiros e brasileiras.

Afinal, quem lucra com a doutrinação nas escolas?

Esse discurso se aproxima muito da lógica mercantil, na qual o ensino passa a ser mais uma mercadoria e o aluno um consumidor. Mas a educação não é uma mercadoria, tampouco feita direcionada para atender um público específico. Pelo contrário ela atende a uma diversidade enorme de pessoas com concepções de mundo também muito diversas. De tal maneira a educação deve agir dentro dessa diversidade para que os alunos e alunas sejam capazes de conviver em harmonia com o outro diferente de si.

Desse modo a escola que queremos é aquela, segundo Algebaile(2017), capaz de despertar nossas melhores potências, aquilo pelo qual devemos lutar e que está nucleado na garantia de um espaço escolar de elaboração coletiva, um espaço no qual a autonomia não seja entendida como prerrogativa individual, mas como construção colegiada e solidária.

E se há algo que não ajuda nesse processo é plantar a suspeição no chão da escola, judicializando suas relações e práticas, e impondo, deste modo, que ela viva sob a intervenção de quem dela não participa. Algebaile, Eveline, 2017, p.73.

Penna(2017), corrobora o debate ao dizer que: então o pai, a família tem o direito de educar, no espaço privado, os seus filhos de acordo com seus valores.

Agora qual o equívoco aqui? É quando você pega algo que foi pensado para proteger o espaço privado contra a intervenção do poder público e habilita uma invasão do espaço público, da escola pública, pelas vontades privadas. Este é o equívoco, aqui está o erro. PENNA, Fernando, 2017, p. 47

Dessa maneira, fica evidente a confusão entre o que é do âmbito do público e o que é do âmbito do privado.

Como o tema e o momento exigem, o presente Projeto poderá apontar um dos caminhos para a construção de uma Escola enfim, Democrática.

    Princípios Constitucionais do Art 206 da Carta Magna:

Constituição Federal (Texto compilado até a Emenda Constitucional nº 93 de 08/09/2016)

Título VIII
Da Ordem Social

Capítulo III
Da Educação, da Cultura e do Desporto

Seção I
Da Educação

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I- igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II- liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III- pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV- gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V- valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;

VI- gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII- garantia de padrão de qualidade;

VIII- piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.

Parágrafo único. A lei disporá sobre as categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação básica e sobre a fixação de prazo para a elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

ANEXO

A DOCENTES E ESTUDANTES

I – é assegurada a livre manifestação do pensamento, conforme previsto na Constituição Federal;

II – é assegurado o direito à liberdade de manifestação e de expressão intelectual e a liberdade para aprender, ensinar, pesquisar, ler, publicar e divulgar o conhecimento, o saber, o pensamento, as artes e a cultura, sem qualquer tipo de censura ou repressão;

III – é assegurado o direito de tratar, em sala de aula e fora dela, de questões políticas, socioculturais e econômicas, com liberdade e pluralidade de opiniões e pensamentos.

NA ESCOLA

I – Não há lugar na Escola para o preconceito, a violência, a marginalização social e a estigmatização das pessoas pela origem ou condição social, cor da pele, sexo, etnia, deficiência, orientação sexual, identidade e/ou expressão de gênero, nacionalidade ou qualquer outro pretexto discriminatório.

II – deve-se educar contra todas as formas de discriminação, marginalização social e violência física e simbólica, promovendo-se o respeito pela diferença e a celebração da convivência plural e democrática.