A Câmara Municipal de Ouro Preto decreta:
Art. 1º - Fica concedido Título de "CIDADANIA HONORÁRIA" ao Sr Jorge Adílio Penna pelos relevantes serviços prestados a este Município.
Art. 2º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Justiicativa:
JORGE ADÍLIO PENNA: UM CIDADÃO OURO-PRETANO
Foi no final de 1967 ou início do ano de 1968 que conheci Jorge Adílio Penna. Não me lembro da data exata. Lembro-me que foi no primeiro dia das provas de seleção para o sonhado ingresso na Escola Técnica Federal de Mineração e Metalurgia de Ouro Preto.
Quando deixava o pavilhão onde acabara de fazer a prova, encontrei aquele jovem mais ou menos da minha idade, também saído recentemente do curso ginasial e aspirante a aluno da conceituada Escola Técnica. Disse-me que vinha da cidade de Caratinga, não conhecia a Ouro Preto e estava meio que perdido, sem saber como chegar ao Bairro Rosário, onde estava hospedado; por uma dessas coincidências da vida, era o Bairro onde morávamos, eu e minha família, e ao qual eu me dirigia.
Do alto do Morro do Gambá, através da hoje nominada Rua Pandiá Calógeras – à época uma via com poucas casas, sem calçamento e muita poeira vermelha, até nosso destino, foram muitas conversas e já combinamos que subiríamos juntos para as provas do dia seguinte.
Aprovados no processo seletivo, iniciaríamos importante fase de nossa juventude. Eu vinha do Colégio Arquidiocesano, onde concluí o curso ginasial, tendo como colega de sala Ronaldo Herbet Bayão Toffolo, aluno brilhante cujos conhecimentos conduziram-no à Turma A, na primeira série da Escola Técnica, enquanto eu e Jorge Adílio fomos lotados na Turma B. Ronaldo Toffolo e eu havíamos sido alunos de português do Padre Mendes, lá no Colégio Arquidiocesano, e éramos, à época, sócios neófitos do Grêmio Literário Tristão de Ataíde (GLTA), convidados que fomos pelo Padre Mendes.
Nos primeiros dias de nossas aulas, conhecemos outros dois jovens irmãos vindos da cidade de Ubá, Tarcísio de Lucca e José Braz de Lucca, nossos colegas de sala e também residentes no Bairro Rosário. Fomos todos ser alunos do Padre Mendes – agora, nosso professor de Inglês –, nos tornamos, todos, fãs dos Beatles, nos reunimos no GLTA, sob a liderança e a amizade generosa do Padre Mendes, e nos tornamos amigos, unidos por uma amizade que varou os anos e permanece forte nos dias atuais. Conhecemos outros jovens que também se tornaram nossos amigos diletos, como o Zezinho (José Augusto), também ex-aluno da Escola de Minas que frequentemente volta a Ouro Preto e que, até hoje, refere-se ao Jorge como o “Chulé”, o “nome” de batismo que lhe foi dado por ocasião do trote, o rito de passagem que marcava o ingresso dos jovens na Escola de Minas e Metalurgia de Ouro Preto (naquela época, o trote era realmente um ritual de ingresso na vida universitária, acadêmica, e não tinha as características desumanas que adquiriu posteriormente).
Esse grupo de amigos tornou-se inseparável. Ronaldo Toffolo e eu, os “nativos”, passamos a frequentar a República dos outros; todos nós frequentávamos a casa de Ronaldo Toffolo; e todo o grupo frequentava a casa de meus pais.
Concluído o Curso Técnico, quase todos nós seguimos o caminho natural e ingressamos na Escola de Minas, onde cursamos Engenharia. Digo quase todos, porque o amigo José Braz de Lucca, Técnico em Mineração, ingressou nos quadros do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e foi exercer suas atividades, como Técnico em Mineração, na cidade do Rio de Janeiro.
Frequentando nossas casas reciprocamente, atravessamos a era da revolução dos costumes no final dos anos 60 e início dos anos 70. Vi o Jorge Adílio exibir fartas barba negra e cabeleira desgrenhada e encaracolada, usando calça Lee desbotada e surrada e sandálias de couro cru, enquanto ouvia as mais influentes bandas de rock psicodélico da época e tocava flauta doce. Fomos revoltados contra as amarras que nos eram impostas e contestadores do modus vivendi que se via ao nosso redor. Vi Jorge Adílio dedicar-se ao canto no Coral de Ouro Preto.
Quis o destino que conhecêssemos outros alunos da Escola de Minas – moradores, a maioria deles, da República dos Deuses, também no Bairro Rosário –, e passássemos a dividir com Paulo César, com os irmãos Celso e Cemi, com Sabino, com os nativos João do Pandeiro e Tatá, também conhecido como Itatiaia, outros gostos comuns e a exercitarmos outros dons artísticos, agora na área da música, da poesia e da composição de canções populares. Era a época de ouro dos Festivais da Canção em todo o Brasil, e lá ia o Grupo Ave levando nossas composições em vários deles, tendo nossos versos mutilados pela censura vigente à época, vencendo um festival aqui e outro acolá. O importante era mostrar nosso trabalho. E foi assim que o Jorge Adílio tornou-se meu parceiro em várias canções que empolgaram entusiasmadas plateias e nos renderam troféus que guardamos até hoje. E para compor nossas canções, foram muitas madrugadas, regradas a água ardente sem tira gosto, por absoluta falta de recursos financeiros que nos tirassem desses pileques básicos.
A família do Jorge Adílio mudou-se para Ouro Preto. O Sr. Penna, pai do Jorge, era ferroviário aposentado, assim como meu pai. As famílias, com pontos em comum, tornaram-se amigas. Era ao meu pai, ao Sr. Penna e ao Sr. Rodrigo, pai do Ronaldo Toffolo, a quem nós, Jorge, Ronaldo e eu, recorríamos para nos tirarem do sufoco na execução das mais diversas tarefas que tínhamos a desempenhar no GLTA, que nos eram designadas pelo Padre Mendes, que tinha entre as suas tantas características o princípio de não aceitar “não” como resposta.
No GLTA conheci uma menina que me pareceu bastante petulante e a quem resolvi azucrinar, só de farra. Mas fui fisgado pelo coração e o que era uma brincadeira inconsequente, transformou-se em namoro. Vera, a petulante, tinha uma irmã, também sócia do GLTA e, assim como Vera, muito querida pelo Padre Mendes, que era amigo dileto da família Ramos. Jorge também começou a frequentar a casa do Sr. Geraldo Ramos e Dona Negra e, pouco depois, lá estava ele namorando Ângela, a irmã de Vera. Casamos na mesma casa. Eu e Vera somos padrinhos de batismo do Leonardo – o Leo –, filho mais novo de Jorge e Ângela. E ambos ajudaram-nos a criar nosso filho Bruno como se ele fosse o terceiro filho deles.
Ainda que eu não fosse advogado, não seria tarefa árdua demonstrar que estamos, por honra e mérito, diante de um cidadão que merece o título de ouro-pretano.
Jorge Adílio Penna é ex-aluno da Escola Técnica Federal de Ouro Preto – hoje Instituto Federal de Educação de Minas Gerais, onde concluiu o Curso Técnico em Metalurgia, na turma de 1970; é ex-aluno da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto, onde concluiu o curso de Engenharia Civil na turma de 1977. Casou-se com uma nativa e teve dois filhos nativos. Aposentou-se como professor do Departamento de Engenharia Civil da Escola de Minas, depois de dedicar 35 anos de sua vida à Instituição. Não morou na Rua Direita, mas reside até hoje na Rua Felipe dos Santos, no Bairro Antônio Dias.
Sua colaboração à formação dos jovens que Vêm estudar na UFOP não se restringe à área do ensino. Foi presidente do Colegiado do Curso de Engenharia Civil e coordenador da ampla reforma curricular dos cursos de Engenharia, promovida pela Escola de Minas na década de 1990. Profundo conhecedor das normas institucionais e dos currículos dos cursos de Engenharia e da UFOP no geral, administrador hábil e pesquisador dos sistemas brasileiros de ensino, pesquisa e extensão, foi Vice-Diretor da Escola de Minas por ocasião da construção do novo prédio da Instituição, no campus Morro do Cruzeiro, ainda nos anos 1990, e Pró-Reitor de Graduação da UFOP, já nos anos 2000.
Sempre teve atuação de destaque como membro do Conselho Departamental da Escola de Minas, assim como membro do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e do Conselho Universitário da UFOP. No exercício dessas funções administrativas, prestou relevantes serviços à Instituição e à educação, pois sua colaboração não se estendeu apenas à área do ensino e ou à estruturação dos cursos de Engenharia, mas a todos os cursos da Universidade Federal de Ouro Preto. E, em razão da vasta experiência adquirida nesses 35 anos dedicados ao ensino, continua colaborando regularmente com a Administração da Universidade, mesmo aposentado, assessorando-a na análise da viabilidade da criação de novos cursos, da reforma dos existentes, e instalação de novos campi da Instituição em outras regiões.
Como Presidente do GLTA, juntamente com o Padre Mendes, esteve à frente da organização dos Festivais de Música Popular Brasileira de Ouro Preto, que alcançaram repercussão nacional, tendo em vista a qualidade das canções reveladas e o alto nível técnico do corpo de jurados. E muitas outras realizações marcaram sua passagem como sócio efetivo e presidente do Grêmio Literário Tristão de Ataíde.
Como Engenheiro Civil com especialização na área de saneamento, tem dado a sua contribuição para o desenvolvimento de Ouro Preto, buscando soluções técnicas para as questões que nos afetam nessa área. Como cidadão político que se preocupa com a cidade onde vive, é frequente às reuniões da Câmara de Vereadores, conhece os principais problemas e dificuldades que nos afligem e atua em prol da cidade através das suas atividades partidárias.
Como cidadãos ouro-pretanos, Jorge Adílio e Ângela têm intensa atividade na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Ouro Preto – APAE-Ouro Preto, através da qual levam sua solidariedade, afeto e amor aos alunos que lá frequentam. Não se furtam de prestar seu auxílio e solidariedade a muitas famílias carentes de Ouro Preto, orientando a sua atuação pelo princípio bíblico que preceitua que “não saiba tua mão esquerda o que pratica a tua mão direita”.
Jorge continua um amante apaixonado da boa música popular brasileira. Dá continuidade a esse amor produzindo e apresentando o programa semanal “O choro é Livre” na Rádio UFOP FM, onde conta a história dos grandes compositores desse gênero musical tipicamente brasileiro e apresenta composições memoráveis dos grandes compositores que honram o gênero. É fã incondicional do Grupo Musical Ouro-Pretano “Candongueiros”, em cujas apresentações ele faz questão de estar sempre presente.
Depois do amor incondicional à família, do amor com que realiza as obras sociais, do amor ao ensino, dedica o amor que lhe sobra ao Clube Atlético Mineiro – o time do coração – e esta paixão ele transmitiu aos dois filhos, como herança genética. Para melhor assistir aos gols do Galo, fez questão de comprar um aparelho de tevê de tela gigante e imagem cristalina, impecável, embora, muitas vezes, seja obrigado a ver gols que não gostaria de ver, quando os autores das façanhas são os atacantes adversários.
O filho Daniel, seguindo os passos do pai, formou-se em Engenharia Civil na UFOP, tornando-se mais um ex-aluno da Escola de Minas. Não foi para a área de ensino, mas para a empresarial, como membro da equipe profissional de conceituada empresa mineira que se dedica à prestação de serviços de consultoria e elaboração de projetos, nos diversos segmentos da engenharia. O filho Leonardo foi para o campo da publicidade e propaganda.
Se os campos profissionais parecem apartados, em realidade não o são, quando se atenta para o fato de que estamos diante de uma família de artistas. O Leo eleva-nos a alma quando se senta ao piano e, através das atividades profissionais, está ligado ao mundo artístico. Talvez um deles se case com uma nativa e lhes dê, a ele e Ângela, netinhos ou netinhas – quem sabe – também nativos.
Posso, portanto, afirmar que vi nascer um autêntico ouro-pretano, embora o seu umbigo tenha sido enterrado lá pelas bandas de Dom Silvério (os cabelos, ele os perdeu aqui; também aqui, sua barba negra tornou-se grisalha), quem sabe bem na curva de um rio que acabou por trazê-lo para as veredas das bandas de Vila Rica, onde ele cresceu, floresceu, e deu bons frutos e boa sombra, na qual ele abrigou sua vida, sua família, seus amigos, seu time do coração e seus livros. Para caracterizá-lo como um ouro-pretano nato, só lhe falta o umbigo e o reconhecimento da nossa sociedade. Tenho certeza que, em breve, somente lhe faltará o umbigo enterrado em terras de Vila Rica. Esse é o meu desejo, como seu amigo fraterno desde a década de 1960 e seu compadre – um laço e um título que hei de ostentar, com muito orgulho, por toda a minha vida.